segunda-feira, 17 de outubro de 2011

O convite à viagem



Irmã, filha, escuta,

Pensa na doçura

De irmos para lá viver, sim!

Amar à vontade,

Amar e morrer

Nessa terra igual a ti!

Os húmidos sóis

Dos nevoentos céus

Têm para mim os encantos

Assim misteriosos

Dos teus falsos olhos,

Entre as lágrimas brilhando.


Lá tudo é beleza e luxo,

É ordem, calma e volúpia.


Móveis reluzentes,

Polidos pelo tempo,

Decorariam a câmara;

As mais raras flores

Fundindo os odores

Ao vago aroma do âmbar,

Riquíssimos tectos,

Profundos espelhos,

O esplendor oriental,

Tudo falaria

Com a alma em surdina

A sua língua natal.


Lá tudo é beleza e luxo,

É ordem, calma e volúpia.


Vê nesses canais

Dormir essas naus

Cujo humor é vagabundo;

É para saciar

As tuas vontades

Que vêm do fim do mundo

– Os sóis, já deitando-se,

Envolvem os campos,

Os canais, toda a cidade,

Com oiro e jacinto;

E o mundo dormindo

Numa quente claridade.


Lá tudo é beleza e luxo.

É ordem, calma e volúpia.


Charles Baudelaire, As Flores do Mal (trad. Fernando Pinto do Amaral)

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